sábado, 17 de abril de 2021

Lugar incrível



Quando eu tinha apenas onze anos meus pais compraram uma casa em um lugar incrível. Casa pequena, reforma a fazer, paredes antigas, terreno íngreme. Lembro que minha mãe não gostou nada da casa e até duvidou da competência de meu pai em fazer escolhas razoáveis. Aos olhos de um adulto, como aos de minha mãe, foi um péssimo negócio. Aos meus, um sonho, um grande sonho.

Eu gostei do lugar a começar pelo número da rua: cento e onze. Hoje me parece bobagem, mas a ideia de morar numa rua cuja identificação era três números iguais me trazia um certo fascínio. Sempre gostei de números, mas não o suficiente para ser bom em matemática. Durante todo o tempo que morei neste lugar, o número cento e onze me foi interessante.

As árvores eram abundantes naquele lugar. Lembro-me que quase todas as casas da rua tinham um pé de jambo no quintal. A nossa era uma delas. Na época desta fruta, tínhamos para "dar e vender", mas se perdia, pois todos também tinham para "dar e vender". Havia uma áurea especial ali.

Eu e meus irmãos formamos algumas amizades muito rápido. Conseguimos nos identificar com os dois garotos que moravam em frente, filhos de uma senhora cristã. Lembro-me que meu irmão caçula foi o que mais se afeiçoou da amizade, pois a faixa de idade deles era semelhantes.

Cada dia tinha um enredo especial, porém bem simples: estudar e brincar. Estudava a tarde, era aluno da Tia Rosilda e o último a sair da escola, pois a professora fazia questão que eu lesse o maior texto do livro, como requisito para largar. Na escola aperfeiçoei a leitura, a escrita e o gosto pelo pensamento. Acho que já ali algumas raízes de um "eu" mais filosófico eram lançadas.

Neste lugar aprendi a empinar pipa, jogar xadrez, dominó e a fazer amizades com pessoas mais velhas. Neste lugar aprendi a subir em árvores mais altas, andar sobre o muro e descer na mata atrás de pipas cortadas em disputas regadas à cerol do brabo, aquele que cortava até pescoço.

Ali chorei quando o Brasil perdeu da França na final da Copa do Mundo de 1998, assisti Ratinho e ganhei um Super Nintendo. Foi ali que zerei meus games preferidos, me descobri adolescente e me apaixonei. Ah, me apaixonei por uma moça que sequer sabia que eu existia, mas me apaixonei.

Este lugar incrível tinha rua asfaltada, muitas crianças e uma grande mata ao final. Tinha a Mônica, tinha o Kleiton, tinha o Miquéias, o Jefinho e o Robinho. Todos crianças ou pré-adolescentes, todos felizes. Sim, uma felicidade que se traduzia em gargalhadas e conversas jogadas fora.

O Jefinho, que era meu vizinho de parede, torcia fanaticamente pelo Santa Cruz. Seus pais, tios e amigos, jogavam dominó toda noite, era uma festa. Enquanto eu, meus irmãos e meu pai assistíamos Ratinho na TV, ouvíamos as batidas nas peças de dominó na mesa. O barulho já fazia parte da natureza do lugar, pelo menos para mim. Sem ele, alguma coisa faltaria.

O lugar para mim era mágico, sempre pensei assim. Mas, em que consistia a mágica de Caetés 1, em Abreu e Lima, Pernambuco? Consistia na leveza, pureza e inocência. A mágica, na verdade, não estava no lugar, estava em mim. Eu estava descobrindo o mundo, rompendo com a infância, flertando com a adolescência. Tudo era novo e isso me encantava. As sensações daqueles dias me parecem tão reais hoje!

A verdadeira mágica estava em mim, pela entrega aos novos saberes que a vida estava me oferecendo. O lugar foi o cenário perfeito, as pessoas personagens incríveis. Os dias, maravilhosos. Mas eu era o cerne da questão. Conhecer era meu impulso, meu encanto.

Tal qual o encanto que me preencheu a mente e o coração na tenra idade, deve ser o nosso encanto pela vida, pela razão, pelo saber. O filósofo deve ser como uma criança no perguntar, como um sábio no responder e como um herói no viver. Por que herói? Por que estará sempre se resgatando de si mesmo, evitando que mente e corpo sejam entregues ao incolor medo de ser feliz. 

Você é a mágica de sua felicidade, eu sou da minha. Vivamos o sonho da leveza, do querer viver e ser feliz! 

Autor: Líniker Santana







3 comentários:

  1. AMEIIIII 😍, parte 2 pfvrrrrr 🙌🙌🙌🙌

    ResponderExcluir
  2. Fiquei tão presa na leitura quanto quando estou lendo comédia romântica ksksskksks 👏👏👏👏

    ResponderExcluir
  3. Magnífico, amei ����������

    ResponderExcluir